Minha amiga

Minha amiga

MINHA AMIGA

Só estou esperando que o tempo passe
E a minha amiga venha me visitar
Quem sabe ela vem se eu chamar
Quem sabe não esteja tão ocupada
Eu a quero bem, quero-a para mim
Diz que vem um dia, quando eu menos esperar
E estou certa de que não me engana, minha amiga
Tão só que é, tão chutada dos hospitais
Por rezas escurraçada

Imagino-a vindo, sorrindo
Até que enfim!
E se senta do meu lado, um sol de rachar
Nem pergunta o meu nome e diz para eu ir:
"Vamos, vamos! Por Deus! Vim te buscar."

Imagino-a linda, de cabelos louros
E faces rosadinhas
Um vestido branco a cobrir um corpo branco,
Palidozinho
Ninguém a quer, apesar de tanta beleza
Eu sim a quero

Não há mais nada em lugar algum
Só um deserto
Infinito, infinito...
Como a vida dos tristes e solitários
E daqueles que sonham com a tal morte loura
De mãozinhas quentes, pequeninas

DIZEM QUE É TOLICE DESEJAR A MORTE
MAS, AO MENOS, A MEU VER, QUE SE DESEJE ALGO
NEM QUE A MORTE SEJA
E QUE TAL DESEJO DÊ PACIÊNCIA
QUE A MORTE VENHA POR SI SÓ UM DIA

Estou esperando minha amiga
Antes de irmos embora lhe farei uns pedidos:
Quero que finja ser boa
que faça de conta ser minha amiga
Não exijo sinceridade, não exijo mais nada
Quero que me leia um conto
que me recite um poema
que me cante uma canção
E, se não for pedir muito,
que toque Haendel
- Música para os reais fogos de artifício.

Quero com ela fazer um piquenique
com frutas, pães, nuvens no céu
Quero que tenhamos uma cesta de vime
uma toalha xadrez – branca e vermelha
Quero que ela ria e que me faça rir
- Quero rir de felicidade antes de irmos embora -
Quero ter de novo um momento mágico
Mas e mais feliz de verdade
Para poder dizer a todos e a mim mesma
Que ele existiu e eu não estava só

Quero que a morte seja uma criança
Para no fim do dia se cansar dos meus desejos
E dizer:
"Vamos, vamos! Por Deus! Vim te buscar."

Natalia Bonfim (2001)